Cristóvão Feil, sociólogo
Duas notícias que saíram no mesmo dia nos jornais brasileiros na semana passada precisam ser relacionadas entre si para darem sentido diverso do que podem representar, se lidas de forma isolada. São essas duas notícias:
1ª) Montadoras enviaram do Brasil para as matrizes, até setembro, US$ 4,8 bi. Essa notícia saiu no jornal O Globo, do Rio.
2ª) Banco do Brasil socorre montadoras com R$ 4 bi, notícia que saiu no O Estado de São Paulo, de São Paulo, na última quinta-feira (06).
Montadoras são as fábricas de automóveis multinacionais que produzem veículos no Brasil, alimentando o nosso rodoviarismo hipertrofiado, seja no transporte de mercadorias pelas estradas, seja no transporte individual e coletivo nas áreas urbanas do País.
O governo Lula já está no sexto ano e ainda não apresentou nenhum projeto concreto para modificar essa situação calamitosa no Brasil. Automóveis são despejados aos borbotões todos os anos nas cidades e estradas. As cidades estão saturadas de veículos, sem nenhuma política de planejamento centralizado para transporte coletivo urbano alternativo. As estradas são precárias e insuficientes para atender a mobilidade de pessoas e mercadorias, e igualmente não há nada que garanta que em dez anos não estejamos comentando aqui mesmo problema, apenas agravado pelo completo colapso das cidades e o caos nas rodovias.Enquanto isso, repito, um banco público, o Banco do Brasil, injeta R$ 4 bilhões nas fábricas de automóveis. País rico e com tudo o mais “resolvido”, acontece isso. Quer dizer o governo injeta R$ 4 bi na mesma hora em que as montadoras transferem para as suas matrizes nos Estados Unidos, no Japão e na Europa cerca de US$ 5 bi. É, vamos convir, uma situação esquizofrênica.O Brasil carece de projetos urbanísticos para as suas metrópoles. Mas também para suas cidades médias e pequenas. Vivemos em uma era do endeusamento do dinheiro e do automóvel, onde os carros representam muito mais do que realmente são, pois são símbolos transcendentes de status social, poder e identidade com as tecnologias do nosso tempo. Com a crise internacional e a recessão econômica que está por vir, nós poderíamos pensar em mudar nossos paradigmas de vida.
Uma dessas mudanças sem dúvida deve ser a do papel do automóvel em nossas vidas. Essa mercadoria divinizada e sacralizada deve ser objeto de contestação e já devemos começar a pensar em alternativas ao transporte individual representado pelo automóvel. O governo Lula bem que poderia começar a pensar nisso e oferecer novos caminhos para o nosso futuro.
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